quarta-feira, 4 de abril de 2012

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A DANÇA DOS ARCOS 9 - JANDIRA ZANCHI

 
A DANÇA DOS ARCOS - A DANÇA DOS ARCOS

9.
       O Sol despedia seus rubros de rosas e violetas quando Atílio e Amadeu alcançaram os domínios. Detiveram-se, a princípio, nos diversos níveis dos amplos corredores, que desnudos, estendiam-se apoiados em sólidas colunas.
      O ar e seus fluídos de paz espalhavam-se com tanta lentidão e gosto que quase se esqueceram, enamorados de suas espessuras, de construir-se ao pé do enlevo.
     A noite prontificou aromas de bênçãos. Estava plácida, um pouco nua, coberta do ponteio das estrelas.  Sem excesso de lua, era muito nítida, e abria seus raios nas armações dos arcos.
    Marian, dilatada de branco e prata em um dos ninhos, os aguardava sem impaciência. Não fizera mais, no jejum dos últimos setenta dias, do que purificar-se nas estrelas e planificar-se nas claras sombras da tarde.
     Saudou-os com comedimento e estendeu, no piso de mármore, toda série de folhas e frutos do jardim. Quando a noite embraveceu em uma madrugada de muito silêncio e espessura deitou-se com os dois. De a muito já não sabia a qual deles chamar pelo título de marido e, agora, que da Águia só fluiria a fusão da solidariedade, parecia-se tanto com aqueles a quem tanto temera como discípula que para si tomava o único tento, ao mediar o leito, de diferenciar os gêneros apenas nos espaços.
    Os ventos, indômitos, brandiam-se com grande fustigação de uivos, remedando-se na areia.   Ataviados na secura do poente as três faces da mente oravam a chegada. 
-         Essa é a terra dos conflitos, da estiagem da formação. Por aqui os guerreiros firmaram a lança do Senhor dos Arcos – afirmou a moça.
-         No princípio eram turvas as abóbadas e o selo da consciência –  esclareceu Amadeu.
-         Longo e profundo desejo amofinava-se nos corredores da espiral – percebia Atílio. Nenhum se levantava e ornava uma forma. Cientes de que entornariam a longitude dos arcos, aprofundaram, no vazio, toda estima e formosura.
-         Aquele que realmente se destina a irradiar – consentiu Amadeu – muito se satisfaz nos sonos cumpridos, destituídos de forma e cor, imbuídos do silêncio das brumas.
-         As formas não diferem do ventre – explicou Marian – apenas avolumam-se em variedade de densidades numa expressão, cíclica e vertical, das apreensões.
-         A integridade da vontade, aquela que o vetor do movimento elevará - ensinou Atílio – não se deforma em desejos e requintes passageiros.
-         A bem da verdade, – concluiu Amadeu – para conspirar uma transmutação, o indivíduo não deve se reconhecer como indivíduo , antes, encantar-se com a realidade ciente, transtornando-se de vastidão e bons sussurros.
     No branco renascer daquela primeira madrugada Marian estendeu os véus. As cores foram se firmando, traspassadas em suas transparências, quase diluídas, dançantes e longínquas. Pareciam alheias de matéria e direção, porém, sonoras, arredondavam os arcos, retilíneas e curvas, lineares e compostas de sedução.

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