quinta-feira, 3 de maio de 2012

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O celibatário

Ele caminhava junto a dois outros homens pela trilha por entre as pedras, arbustos de um verde vívido e árvores – permitiam apenas a passagem de privilegiados fachos de luz. Por detrás – e além do seu campo de visão – sabia do céu límpido, azul, do sol da manhã a aquecer os seus corpos, garantindo o hálito úmido daquelas paragens. Nada poderia desencaminhá-los de seus desígnios. O mais velho dissertava sobre a importância da alimentação, do sono e de atividades físicas regulares. Nada em demasia. O importante era a qualidade e a regularidade para a garantia da manutenção do corpo saudável, segundo ele, essencial também para a elevação do nível mental e da conexão supramental. “Caso contrário o seu corpo padecerá, irá derreter, a pele escoará sobre os seus ossos, restando apenas uma estrutura cadavérica, desprovida de energia e será o fim de sua jornada nessa terra”. Mas quem era aquele velho sábio, de olhar penetrante, enérgico; e também o outro companheiro, aproximadamente da mesma idade de Renato? Agora o som distante de quedas d’água a absorver-lhe totalmente a sua atenção. A trilha parecia levar às cachoeiras da alma, cujo trabalho das águas havia resultado, através de sucessivas eras, numa bacia côncava, ampla, plácida, acolhedora ao mergulho. Renato já não notava a presença de seus companheiros. Haviam-no deixado nalgum momento da caminhada. A mata limitava-se aos bordos do grande lago. A essa altura o céu de um azul intenso podia ser apreciado em todo o seu esplendor. O suor escorria sobre a sua face, o sol presenteava-lhe com o seu calor. Tirou as suas roupas, calmamente dobrando-as e deixando-as sobre uma pedra mais saliente. Entrou na água, ela regenerava o seu corpo cansado do longo percurso. Mergulhou, afundando todo o seu corpo, deixando-o alguns poucos segundos ao sabor da corrente. Quando emergiu, notou a presença de duas ninfas. Eram belos espécimes femininos, plenas, seguras de seus atributos; os semblantes plácidos daqueles seres sencientes de seus poderes – e também de suas limitações. Uma delas estava na outra margem, deitada sobre uma grande rocha, as mãos entrelaçadas sobre os joelhos, o corpo nu arqueado para trás, a cabeça fitava o céu, a sua pele clara absorvia todo o espectro luminoso da manhã. A segunda estava de pé, com a água pouco abaixo dos joelhos, também próxima àquela margem. Apercebeu-se da presença de Renato quando ele lhe dirigiu a atenção. Uma resposta intuitiva da percepção. Era alta, quase da altura de Renato. O corpo firme, bem torneado. Os seios fartos e umedecidos pela água pura da cachoeira, que a brisa insistia em evaporar, deixando os seus mamilos eriçados. A sua bunda tinha uma curvatura doce, perfeita em regularidade e conteúdo de ambos os glúteos. Os longos cabelos encaracolados caiam-lhe até a metade das costas – a imagem de uma deusa. Renato olhou nos olhos dela que fitavam os seus. Ela atravessou a bacia nadando, calmamente, sem que perdessem o contato visual. De perto, o seu hálito era doce e ele podia sentir a sua respiração acelerada. Ele sabia que o sentimento era recíproco. Aquela bela fêmea enxergava no fundo de seus olhos um homem seguro, consciente de si, de seu entorno. O seu pau estava duro como uma imbuia, latejante, e ela podia perceber a pulsação daquele nervo erétil. Os seus lábios se tocaram. As línguas se entrelaçavam num balé delicioso e táctil. Renato sentia com grande prazer o contato de seu peito àqueles seios macios e quentes. Ela fez sinal para que ele se deitasse, beijando o seu pescoço, descendo suavemente pelo seu peito com sua língua até cobrir docemente o volume de seu pinto com toda a sua gula. Ela deliciava-se com aquele aperitivo; Renato regozijava-se ao menear de seu pau em contato a sua língua e às superfícies internas de sua bochecha macia. Depois foi a vez de ele retribuir as carícias com um longo passeio de sua língua pelas circunferências que delimitavam os seus mamilos. Ela demonstrava o seu encantamento com gemidos breves, doces de prazer. Ele penetrou os dedos pela sua boceta para sentir aquela reentrância quente e doce de suas carnes. Depois levou a boca em direção aos grandes lábios e sua língua a acariciar-lhe o clitóris vibrante. Ela jogava o seu corpo para trás, esticava os seus braços, as mãos, os dedos, todas as suas extremidades num prazer descabido. Ambos sabiam que as partes funcionando em consonância resultavam numa energia muito maior que o todo. Então ele levantou os olhos. Fitaram-se longamente. Renato penetrou o nervo vivo em sua acolhedora, aveludada e deslizante caverna. O movimento de seus corpos era síncrono. E não tiravam os olhos um do outro, como que fitassem as próprias almas. Seus corpos vibravam numa dança doce, indescritível. Até que, como um raio, ambos fossem atingidos simultaneamente por aquele gozo intenso, paradisíaco. Era como a descarga de uma grande explosão, que vinha do âmago de ambos os seres.

Renato despertou. Ele tinha gozado na cama e precisaria lavar pessoalmente os lençóis para que ninguém se apercebesse daquilo. “Que merda”, pensou. Depois ponderou melhor, sorriu, e voltou a cair no sono. Às cinco e meia da manhã o badalar dos sinos o despertou. Renato cuidou de sua higiene pessoal, orou em jejum, das seis às oito, como de costume. Depois tomou o café da manhã com os outros seminaristas.

Entretanto, nada mais seria como antes. A vida fluía intensa pelas areias da ampulheta de seu relógio. Naquele mesmo dia abandonaria o seu anseio de ser padre. Pode ser que nunca tivesse uma alma gêmea com a qual compartilhasse o vislumbre daquele sonho tórrido. Mas tinha absoluta certeza que lutar por isso valeria muito mais que todos os fios de cabelo na sua cabeça.


Crédito da imagem: Van Halen, capa do álbum MCMLXXXIV.

3 comentários

Gabriela

Onde se encontram características do realismo brasileiro no trecho a seguir do livro Dom Casmurro de Machado de Assis?

“Retórica dos namorados, dá-me uma comparação exata e poética para dizer o que foram aqueles olhos de Capitu. Não me acode imagem capaz de dizer, sem quebra da dignidade do estilo, o que eles foram e me fizeram. Olhos de ressaca? Vá, de ressaca. É o que me dá idéia daquela feição nova. Traziam não sei que fluido misterioso e enérgico, uma força que arrastava para dentro, como a vaga que se retira da praia, nos dias de ressaca. Para não ser arrastado, agarrei-me às outras partes vizinhas, às orelhas, aos braços, aos cabelos espalhados pelos ombros; mas tão depressa buscava as pupilas, a onda que saía delas vinha crescendo, cava e escura, ameaçando envolver-me, puxar-me e tragar-me. Quantos minutos gastamos naquele jogo? Só os relógios do céu terão marcado esse tempo infinito e breve. A eternidade tem as suas pêndulas; nem por não acabar nunca deixa de querer saber a duração das felicidades e dos suplícios.”

andre albuquerque

Jorge,o sentir-se vivo através do sonho, já foi uma revelação quanto ao caminho; bela narrativa, ornada pelo anjo enfant terrible de James Van Hallen.Abraço.André

Jorge Xerxes

Valeu Gabriela e André!

Salve Machado de Assis: Grande Mestre de Nossa Literatura!!!

Gabriela, respondendo a sua pergunta:

Cada escritor tem seu estilo. Eu não tenho a pretensão de superá-lo. E imitá-lo seria desnecessário: o seu Memórias Póstumas, o seu Dom Casmurro estão aí.

O realismo é minha forma de expressão, minha arte. Cada um luta com suas armas. Daí a pluralidade e riqueza da literatura, que é puro movimento.

"Ambos sabiam que as partes funcionando em consonância resultavam numa energia muito maior que o todo."

Beijos / Abraços, Jorge