segunda-feira, 14 de maio de 2012

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Pequenas histórias 003


 

 

 
Tinha esquecido





Tinha esquecido as palavras em cima dos nervos da dúvida quando, apaziguando a raiva numa calma de sossego, girou a atenção para outro ponto. Não foi preciso mudar de posição o corpo, apenas uma leve torção do pescoço para ver o que lhe interessava. E o que o viu não o surpreendeu, apenas veio confirmar o que há tempos suspeitava. Não se abalou. Voltou para a posição normal, pediu mais uma cerveja, e calmamente tomou como se fosse veneno.
E lentamente, bem lentamente desviou a atenção, desceu até o limite do sentimento, e, se postou dentro do ciúme corrosivo queimando-se pela chama da traição. Quietou-se no silencio que, apesar do alvoroço do palco com a banda tocando alto, das pessoas dançando freneticamente na pista, sentiu o silencio envolvendo-o. De onde estava, sem se virar, via os gracejos, os beijos, as caricias, as risadas, como se tivessem fazendo piada sobre ele.
Sem se precipitar, aproximou-se da mesa onde eles estavam. Assustados não tiveram tempo de reagir. Cada um recebeu um tiro a queima roupa bem no peito, fulminando-os instantaneamente. E antes que pudessem entender o que estava acontecendo, virou a arma para a cabeça e disparou.
- Você tem sorte de estar vivo. Não sei como e nem porque a bala foi desviada, atingiu somente a região do olho causando cegueira. – dissera o médico, assim que acordou após ser operado.
Tem razão, tive sorte, estou vivo, vivo preso na escuridão do meu ciúme ignorante.
pastorelli 

 

 

 

2 comentários

regina ragazzi

O ciúmes é capaz mesmo disso. Forte e bem escrito. Muito bom vir aqui ler esses ótimos textos. Abraços

Jorge Xerxes

Pastorelli,

Um Ótimo Texto!

Gostei especialmente dos 2 primeiros parágrafos; da descrição precisa do sentimento, disso:

"Não se abalou. Voltou para a posição normal, pediu mais uma cerveja, e calmamente tomou como se fosse veneno."

"E lentamente, bem lentamente desviou a atenção, desceu até o limite do sentimento, e, se postou dentro do ciúme corrosivo queimando-se pela chama da traição."

Eu acho que seu conto poderia muito bem terminar ao final do segundo parágrafo, mas o gosto é pessoal...

Um Grande Abraço! Jorge