terça-feira, 1 de maio de 2012

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Pingos na vidraça

Sônia Pillon Da janela da sala de estar, o mundo lá fora é vislumbrado parcialmente, modificado pela queda contínua dos pingos na vidraça. Fico olhando a sombreira, repleta de folhas verdes, que parecem envernizadas pela ação da chuva, contrastando com o cinza do céu e as nuvens tristes. Somente os pássaros, refugiados debaixo dos telhados, parecem desafiar a manhã nublada de quinta-feira com seus gorjeios. Uma breve e lânguida preguiça me invade o corpo, enquanto por um instante fecho os olhos e me deixo levar pelo canto dos pássaros. Essa é uma das vantagens de se morar em um bairro relativamente próximo ao Centro, mas que ainda insiste em manter características de subúrbio: conduz à abstração e permite sonhar... Ou, nos momentos de preocupação e angústia, de usufruir do silêncio que acalma e clareia as ideias. Olho para a gata estirada no sofá, folgada como ela só, e busco a paz interior para enfrentar os desafios do dia, que não são poucos! Pois é, nessas horas de chuva miúda caindo parece que baixa uma espécie de nostalgia não sei de quê, não sei de onde. Lembro de Martha Medeiros, quando fala da dor. “...Trancar o dedo numa porta dói. Bater com o queixo no chão dói. Torcer o tornozelo dói. Um tapa, um soco, um pontapé, doem. Dói bater a cabeça na quina da mesa, dói morder a língua, dói cólica, cárie e pedra no rim. Mas o que mais dói é saudade....” Pura verdade. Mas a vida segue, o mundo gira, a fila anda e a gente vai tocando o barco, enfrentando tempestades, tsunamis... Mas também se surpreendendo com dias de sol e calor, que a vida é bela e está aí para ser vivida, plenamente. Daqui a pouco a manhã se despede, chega o almoço e a correria vai se intensificar até tarde. Hora de esticar os braços, ajeitar o cabelo e se preparar para a batalha. Que roupa vou usar, mesmo?... Ixiiii, agora complicou... * Sônia Pillon é jornalista e escritora, nascida em Porto Alegre (RS) e desde 1996 radicada em Jaraguá do Sul (SC), Brasil.

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