terça-feira, 5 de junho de 2012

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Veículo sorridente para além-vida




As impressões são espólios do domínio da realidade a impingirem marcas às faces. Mesmo estas hão de se curvarem ante o escoar do tempo. Por isso, ama enquanto a vida te habita. O tempo – vento de grãos – a polir laboriosa e ininterruptamente a realidade da rocha. Assim: as faces transformar-se-ão em cadáveres, e a carne vincada (macerada) servirá de nutriente aos vermes; pois operam através de percepções concomitantes ao fluxo, as impressões. Não há maquilagem, silicone ou antioxidante que dê jeito. Da realidade última nada, ninguém escapa. Sã e salva é a criatura dedicada a uma estranha transcendência daquilo que é árvore. Da essência dela, extraído o tronco, trabalhado em abrigo ao corpo. Pensa no féretro como veículo para o corpo de além-vida. Tão somente isso. Pensa, a realidade é o que fica: daqui nada se leva. O amor distribuído em vida será a realidade dum sorriso; o ressentimento e o recato, gargalhada bizarra na boca do infinito.



Photography by Joanne Wells: ‘Bonaventure Cemetery with Moss Draped Oak, Dogwoods and Azaleas’, Savannah, Georgia, USA.





1 Comentário

andre albuquerque

Jorge: belíssima reflexão sobre a vida e o viver .Remeteu - me a Krishnamurti pela capacidade persuasiva. Parabéns,André