LUNA
4.
No Mosteiro Mona respirava a
manhã com satisfação. Apreciava aquele sacro luminoso, quase distraído,
desligado de pompa e munido de poesia pueril.
- É quase perfeito – dizia.
- Falta o que, Mona? – a voz grave
de Amilton era de ironia e conformação.
- Falta – e Mona fixou seus olhos no
azul do Mestre – falta... emoção?
- Emoção... – Amilton com sua
elevada estatura aproximava-se da bela – emoção... as moças gostam de emoção.
- Eu não falei romance.
- Sei, mas um príncipe encantado
pode ser vestido de natureza, instante, apreensão, esperança, temor.
- Está me ofendendo, Amilton.
- Muitos machos também procuram
emoção e, ser mulher e romântica não é ofensa. A maioria, de alguma forma, o é
na tua idade. Mesmo as muito rigorosas na aplicação dos estudos de ciência e
filosofia.
- É mesmo?
- É comum. Também, alimentando-se no
tradicional, alguns homens continuam eternos caçadores. As reações podem não
ser tão evidentes, mas a busca de emoção costuma ser um dos sintomas.
- Psicologia cartesiana.
- Não, inconsciente, prazer,
sexualidade, lúdico, impulso. Natureza, talvez.
- E você?
- Já me domei, também quis emoções.
- Por que não as proporciona?
- Não sou partidário da construção
de uma comunidade em cima de tais artimanhas. Não significa que não tolere “os
desvios”, com aspas, viu? São-me indiferentes.
- Não acho difícil entender.
- A paz é a base de tudo, minha
querida. Precisamos de segurança e bonança, claridade depurada, verticalizada.
- Eu sei que você não é um
moralista, Amilton, eu sei. Ainda assim discordo, imagina por que?
- hummm.... porque a paz pode acabar
por motivos naturais ou interiores. Devemos ser prontos e prestos no desbravar
do universo. Conheço a cantinela, tenho alguns parceiros que se autodenominam
guerreiros, outros feiticeiros, ou ambos, e fazem surpreendentes magias. Sei
que não sou um ponto final. Talvez um momento, uma opção, uma ação para a
retomada de uma continuidade. Essa paz, porém, é satisfatória para mim e para
muitos.
- Excelente para se criar família,
fazer ciência, erudição, cânticos límpidos e claros como os teus bosques.
- Não quer nada disso?
- Também, mas vou além.
- Uma poeta – Amilton a levou para
um banco bem posicionado no jardim, cercado de flores encantadoras.
- Talvez o futuro não seja tão
simples, Amilton.
- Alguns dos Mestres da força, que
procuram nosso reino para asilo, me dizem o mesmo. Aceitam o fim do binário
predador/vítima e apontam para o futuro aonde o homem, em busca de sua
eternidade, vai abrir, como os bruxos, as portas da percepção.
- E se alçar às muitas dimensões,
beber em todos os ritmos, pulsões...
- Existem portais aqui.
- Por que nunca me contou antes?
- Por que contaria?
- Verdade.
- Procure-os. Esses mestres de quem
falei fazem mais do que iniciar monges em exercícios físicos , ritos e
disciplinas.
- Alguma magia pelo que ouvi falar.
- É, são insistentes. Querem manter
a imensa liberdade de que já desfrutaram.
- Não se sente tentado?
- Não, sou o estar do que faço. Mas
não proíbo. Não é o teu estar essa primeira via de guerreiros e feiticeiros,
esse voo quase brutal inspirado na matriz. Mas pode te interessar.
Mona tocou-lhe a mão suavemente. Entendia, agradecia a permissão. Sabia
que não era do seu agrado e, por isso, sentia-se ainda mais devedora. Se
pudesse aquietar-se com os livros, os instrumentos de precisão, os cânticos, as
aulas, o sublime e louro sol daquelas manhãs. Seriam aquelas noites cientes da
longa lua e das estrelas permissivas? Antes que pudesse perguntar ao Mestre,
viu-o retirar-se. Era um homem sábio e ciente.
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